terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Jonatha Crary. 24/7 CAPITALISMO TARDIO E OS FINS DO SONO (2014)

Em sua inutilidade profunda e passividade intrínseca, com as perdas incalculáveis que causa ao tempo produtivo, à circulação e ao consumo, o sono sempre  estará a contrapelo das demandas de um universo 24/7. A imensa parte de nossas vidas que passamos dormindo, libertos de um atoleiro de carências simuladas, subsiste como uma das grandes afrontas humanas à voracidade do capitalismo contemporâneo. O sono é uma interrupção sem concessões no roubo de nosso tempo pelo capitalismo. A maioria das necessidades aparentemente irredutíveis da vida humana - fome, sede, desejo sexual e recentemente a necessidade da amizade - foi transformada em mercadoria ou investimento. O sono afirma a ideia de uma necessidade humana e de um intervalo de tempo que não pode ser colonizado nem submetido a um mecanismo monolítico de lucratividade, e desse modo permanece uma anomalia incongruente e um local de crise no presente global. Apesar de todas as pesquisas científicas, frustra e confunde qualquer estratégia para explorá-lo ou redefini-lo. A verdade chocante, inconcebível,  é que nenhum valor pode ser extraído do sono.
Não é surpreendente que, em todo lugar, esteja em curso uma degradação do sono, dada a dimensão do que está economicamente em jogo.

CRARY, Jonathan. 24/7 Capitalismo tardio e os fins do sono. São Paulo:  Cosac Naify, 2014, p.20.

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